Colunistas
Hipocrisia institucionalizada – Lucas Gonzalez
Na semana passada, presenciei na Câmara dos Deputados um episódio que jamais imaginava vivenciar sob vigência de um Estado Democrático de Direito – o desrespeito flagrante à essência da Constituição, a liberdade. Em um ato muito infeliz e inconsequente, um parlamentar destilou palavras de baixo calão em face dos Ministros do STF. Os desdobramentos desse fato deflagraram a vulnerabilidade das nossas leis. Não há dúvidas do excesso ou do desrespeito – o próprio parlamentar e seu defensor reconheceram tal atitude em sessão extraordinária, realizada na Casa do povo.
A situação, no entanto, parou o Brasil. Não pela seriedade das denúncias feitas à mais alta Corte deste país, ou pela infelicidade do seu discurso, mas pela desarrazoada e inconstitucional decisão do STF, que decretou a prisão deste parlamentar. Não há um aspecto sequer dessa sentença judicial que seja compatível com a Carta Magna.
O direito rege-se pelo princípio da proporcionalidade, aliás, não se pode dizer que há justiça quando não há conformidade entre o ato e sua consequência. É simples. Se um indivíduo, por exemplo, estaciona o carro em local proibido, não pode receber do Estado a mesma sanção que um outro que tira a vida de um vizinho. Em outras palavras, se as penas perdem a essência da proporcionalidade, tornam-se injustas.
A lei, nesse sentido, garante a dosimetria adequada da sanção a fim de que não haja arbitrariedade na aplicação das leis. No caso em tela, não há dúvidas mínimas acerca da ilegalidade da decisão. O STF, principal responsável por protegê-la, acabou por ultrajá-la. Quanta incoerência.
A Constituição garante aos parlamentares a inviolabilidade penal e civil por suas palavras e votos, por óbvio, essa imunidade não existe para blindar parlamentares do cometimento de crimes, mas para proteger a liberdade daqueles que falam por milhões de brasileiros. Os excessos, certamente devem ser punidos, inclusive existem ferramentas legais para isso, cito o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, que delibera sobre a quebra de decoro.
Ademais, garante ainda a Carta Magna que parlamentares apenas podem ser presos em flagrante de crimes inafiançáveis, o que não aconteceu em nenhum dos dois aspectos. Não houve flagrante, nem cometimento de crime inafiançável.
O STF simplesmente ignorou estes importantes comandos constitucionais, porque foi arduamente criticado. O gesto, além de demonstrar desrespeito à Constituição, evidencia o quão despreparado estão para lidar com um dos desdobramentos mais positivos da democracia, a crítica. De novo, o excesso poderia ser corrigido por uma via mais adequada.
É triste constatar que crimes com potencial ofensivo muito maiores que estes estão há anos aguardando julgamento da mais alta Corte do país. É igualmente lamentável perceber que parlamentares pegos em flagrante delito (como dinheiro na cueca) estão soltos. Por isso é inconcebível compreender este posicionamento.
O que dizer então da decisão que considerou inconstitucional a prisão em segunda instância? A mensagem que esta Corte passa ao Brasil é que a nossa Constituição favorece corruptos e pune desarrazoadamente aqueles que ousam denunciá-los, o que por certo não é.
Por 364 votos (70 % dos deputados federais) condenou um deputado por suas falas contra o STF, enquanto na verdade, deveriam apreciar a compatibilidade da prisão à luz da Constituição. Não o fizeram por que?
Para completar a farra, a mesma Câmara dos Deputados que condenou um homem por suas palavras, em menos de uma semana apresentou uma PEC que, sob o pretexto de sanar eventuais lacunas sobre tema, estabelece uma camada constitucional impenetrável que favorece deputados corruptos.
Não é preciso muito conhecimento teológico para saber que Deus abomina comportamentos como estes, que usam da lei como pretexto para perpetuação de injustiças. Salmos 94:23 deixa esta verdade em bastante evidência.
“Poderá um trono corrupto estar em aliança contigo? Um trono que faz injustiças em nome da lei?”
Um cristão genuinamente comprometido com as verdades do Evangelho não consegue avaliar essa situação sem se incomodar. O povo de Deus que fecha os olhos para as injustiças, certamente são partícipes dessas atrocidades.
Uma decisão judicial ou uma lei que deturpa a justiça, certamente não passará despercebida pelos olhos do Senhor. Cada um de nós, na medida de nossa responsabilidade, responderemos pelas ações e omissões que cometidas em face de nossa nação.
Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Portal Gospel Minas.
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